segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009

Número de transplantes no Brasil tem o maior aumento em 4 anos

Coração e fígado são os que mais crescem; resultado das cirurgias e perfil dos transplantados são desconhecidos.


Fabiane Leite e Lígia Formenti, BRASÍLIA.


Os transplantes de coração e fígado foram os que mais cresceram no País no ano passado - 29% e 14%, respectivamente - segundo dados divulgados ontem pelo Ministério da Saúde. No total, o aumento dos transplantes foi de 10%, passando de 17.428 cirurgias em 2007 para 19.125 no ano passado.
Apesar do desempenho no número de cirurgias - o maior aumento nos últimos quatro anos -, os resultados dos transplantes e o perfil dos transplantados ainda não são conhecidos.

Estudo feito pela Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos (ABTO) sobre dez anos da atividade no País (1995-2004) mostra que apenas 34% das equipes ativas no fim da pesquisa informaram voluntariamente dados a respeito dos doadores e resultados. Mesmo assim, as informações não abrangeram o total de transplantes realizados pelos grupos, mas só 45% deles.
Foram solicitados pela ABTO dados como idade, gênero, doença de base e cor do receptor, além do tipo de transplante realizado, remédios utilizados após a cirurgia, taxas de sobrevivência e causas de óbito dos pacientes.

Atualmente, a maioria esmagadora dos transplantes no Brasil é feita pelo Sistema Único de Saúde (SUS), que mantém o maior programa público do mundo, mas o País tem apenas dados numéricos sobre os procedimentos.

"Qual é o benefício? Não é o transplante somente. É o resultado. As pessoas estão vivendo com mais qualidade? Os resultados são semelhantes aos internacionais? São perguntas que precisamos responder", afirma Valter Duro Garcia, presidente da ABTO.

O Sistema Nacional de Transplantes promete transformar em obrigatoriedade a informação sobre os resultados dos procedimentos. A ideia é que as equipes só possam cadastrar novos pacientes nas listas de espera de órgãos depois de abastecerem um sistema online sobre os resultados das operações realizadas, semelhante ao que já funciona em São Paulo. "O Sistema Nacional de Transplantes é um processo em construção, tem dez anos e vem sendo aperfeiçoado", afirma o secretário de Assistência à Saúde do ministério, Alberto Beltrame, que promete que a obrigatoriedade de informar resultados estará nas novas regras para o sistema, em discussão hoje.

Segundo o hepatologista Silvano Raia, que encabeça uma iniciativa para a qualificação dos transplantes, saber os resultados permitirá ao ministério, no futuro, descredenciar equipes com desempenhos ruins ou unir aquelas com produção muito pequena para garantir maior eficiência com o escasso número de órgãos disponíveis no País. "Não sabemos se as equipes que não informaram dados não o fizeram por negligência ou por resultados ruins."

Apesar de ainda não serem representativos, os resultados do trabalho da ABTO permitem esboçar o perfil dos receptores nos dez anos avaliados. Os resultados, que abrangem transplantes de coração, fígado, pâncreas, rim e pulmão, indicam que a maioria dos receptores é homem, branco e com idade entre 40 e 60 anos. A faixa etária é a mesma em que se manifestam algumas das principais doenças que levam a transplantes, destaca Garcia. As taxas de sobrevivência foram em geral semelhantes às registradas internacionalmente, exceto no caso de transplante duplo de rim e pâncreas. Dos que morreram, a maioria teve como causa doenças infecciosas, resultado que precisa ser melhor estudado.

DADOS GERAIS
19.125 transplantes foram realizados no ano passado no Brasil, incluindo todos os tipos de órgãos e tecidos.
29% foi o aumento do número de transplantes de coração registrado no País entre 2007 e 2008.
58.634 pessoas estão na fila de espera por transplantes, segundo o Ministério da Saúde.
14% foi o crescimento das cirurgias de fígado no Brasil entre 2007 e o ano passado.

Há mais centros especializados, Secretário também destaca papel das campanhas. O secretário de Atenção à Saúde do ministério, Alberto Beltrame, comemora o aumento de transplantes, mas admite haver "um vazio assistencial" na área. "É preciso capilarizar o atendimento. Muitos Estados não têm capacidade instalada para executar esse tipo de procedimento", completa.
Para ele, o crescimento do número de cirurgias tem vários fatores. Em primeiro lugar, o aumento no número de centros capacitados para a realização da cirurgia que entre 2007 e 2008 passou de 892 para 942. Além do maior número de centros habilitados, Beltrame cita o impacto de campanhas de esclarecimento.
Apesar da melhora, o secretário admite haver ainda uma série de entraves para reduzir a lista de espera por um órgão, que atualmente reúne 58.634 pessoas. O principal deles, em sua avaliação, é o número proporcionalmente baixo de doadores. Na Espanha, o número é significativamente maior: 36 para cada 1 milhão de pessoas. Beltrame diz que, se houvesse um número maior de doadores, o de transplantes poderia ser maior. "Quanto mais transplantes fazemos, mais pessoas se mobilizam para doar órgãos."
Beltrame atribuiu o baixo índice de doações a fatores culturais. "Em certos casos, é preciso que familiares tomem a decisão logo que o diagnóstico de morte cerebral ocorre." Para melhorar os números, complementa, seria preciso "ganhar corações e mentes", algo que teria de ser feito com uma abordagem de profissionais de saúde capacitados.
Embora a falta de doadores seja a primeira dificuldade, há uma série de desafios. Como oferecer o serviço onde ainda não há capacidade instalada. O problema, afirmou, não se resolve apenas com dinheiro, mas também com capacitação de pessoal.

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