domingo, 25 de outubro de 2009

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24/10/09 - 12h00 - Atualizado em 24/10/09 - 12h00
Mudança de regras divide pacientes na fila de transplantes
Menores de 18 anos terão prioridades após alterações.Representantes de entidades que tratam do assunto elogiaram mudanças
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Marília Juste Do G1, em São Paulo

As mudanças nas regras para transplantes divulgadas nesta semana pelo Ministério da Saúde dividiram as opiniões dos mais interessados: aqueles que estão na fila por um órgão. No entanto, as alterações foram bem recebidas por dirigentes de entidades que tratam do assunto.
“São normas muito positivas e demonstrações de que o Brasil está no caminho certo nesse assunto”, afirma Ben-Hur Ferraz Neto, vice-presidente da Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos (ABTO).
A avaliação é a mesma de Térsio Genzini, coordenador médico da Associação para a Pesquisa e Assistência em Transplantes (APAT).
“Várias dessas regras já eram práticas comuns em São Paulo. Agora o governo está expandindo isso para o resto do país. É uma boa medida que dá credibilidade a todo o processo”, diz ele.

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Menores de 18 anos terão prioridade na fila de transplante, diz Ministério
Entre os pacientes, no entanto, as opiniões estão divididas. Alyne Novaes, de 30 anos, na fila por um rim há dois anos e nove meses, concorda com as mudanças – principalmente com a priorização de menores de idade para receber órgãos de doadores da mesma faixa etária.
Geraldo de Oliveira e Alyne Novaes, que buscam transplantes de rim, concordam com a priorização dos jovens.
“Crianças, adolescentes, jovens têm que ter prioridade mesmo porque eles não viveram nada ainda. E é muito triste ficar preso na espera de um transplante. Isso não é vida para uma criança. Já é muito ruim para a gente que é mais velho, mas a gente entende melhor, aguenta melhor”, afirma. “É vantagem para eles, é desvantagem para a gente, que fica para trás. Mas eu acho que está certo”, acredita.
Esse é o segundo transplante que Alyne espera. Diabética desde os três anos de idade, ela perdeu a função do rim há dez anos. Ficou com o primeiro rim que recebeu por oito anos até precisar de um novo transplante. E, agora, duplo. “Preciso de um rim e de um pâncreas. Nem sei como é não estar doente. Onde eu vou, a insulina está comigo”, conta ela.
É muito triste ficar preso na espera de um transplante. Isso não é vida para uma criança"
Geraldo de Oliveira, de 65 anos, perdeu a função dos rins e agora tenta um lugar na fila. Ele também concorda com a priorização dos mais jovens. “É lógico que eu também quero um rim. "Eu preciso de um rim. Mas eu acho importante para os jovens também. Eles ainda têm muita coisa pela frente”, afirma.
Na fila há quatro anos e meio por um fígado, Eliana Favero, de 52 anos, não concorda tanto com as mudanças. “Eu entendo que os jovens precisam, mas o problema é maior que isso. Tenho um amigo de 33 anos que fez transplante de pulmões. Ele estava quase morto. O órgão veio de um jovem de 18 anos. Hoje ele não teria conseguido o transplante”, afirma.
"Eu preciso de um órgão, eu posso morrer por uma série de complicações, mas eu fico deixada na fila"
Com uma doença genética rara que atacou seu fígado, Eliana também critica os critérios para a organização da fila. “As pessoas com a minha doença, por ser especialmente rara, são prejudicadas, porque o nosso risco de morte pela doença não muda muito. Eu preciso de um órgão, eu posso morrer por uma série de complicações, mas eu fico deixada na fila. É uma loteria, quanto pior você está mais pontos ganha”, explica.
Não estou reclamando que as outras pessoas tenham o órgão na minha frente. Elas têm que ter, elas precisam ter. Não sou contra a lei, mas o governo também deveria olhar para a gente. Tem hora que eu me sinto um número. Essas regras ajudaram 80%, mas, nós, os 20%, fomos prejudicados”, afirma Eliana.
Para o vice-presidente da ABTO, o problema de pacientes como Eliana não são os critérios para a priorização dos pacientes, mas a falta de doadores. “Os critérios usados para decidir quem recebe qual órgão são claros e baseados nas melhores evidências médicas que temos à nossa disposição. A solução para esse tipo de problema não é mudar o critério mas aumentar as campanhas e fazer de tudo para que aumente o número de doações”, afirma Ferraz Neto.
“Quanto mais órgãos tivermos, mais poderemos avançar na fila e atender a todos os casos”, explica.