segunda-feira, 20 de abril de 2009

Transplante
4 pessoas recebem órgãos de estudante


Quatro pessoas já receberam os órgãos doados pela família da estudante universitária Nádia Brito, 22, que teve morte cerebral na última sexta-feira. O enterro da jovem, morta por bala perdida, foi realizado no fim da tarde de sábado.
Tiago Bragada Redação 20 Abr 2009 - 01h43min


O metalúrgico aposentado Marco Antonio Correa, 66, se emociona antes mesmo de pronunciar a primeira palavra. Respira fundo e agradece pela vida nova. A única chance de cura para o câncer de fígado era o transplante, realizado neste fim de semana. O novo órgão veio da estudante universitária Francisca Nádia Nascimento Brito, 22, que teve morte cerebral confirmada na última sexta-feira. “Fiquei muito agradecido com essa atitude louvável. Parte da vida dela continua em mim”, diz, com os olhos d?água, enquanto se recupera da cirurgia na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) do Hospital Universidade Walter Cantídio (HUWC).

É que o gesto dos pais de Nádia, que aceitaram doar os órgãos da filha, morta por bala perdida, multiplicou vidas. Ao todo, serão beneficiadas cinco pessoas que estavam na fila de espera por um transplante.

Quatro delas já receberam o novo órgão neste fim de semana, incluindo o metalúrgico aposentado, que recebeu o fígado após um mês de espera.

Os rins foram para uma mulher de 55 anos, que estava na fila há um ano e quatro meses, e para um homem de 58, que esperava pelo transplante há dois anos e sete meses.

Por fim, o coração foi transplantado em uma mulher de 46 anos, que estava na fila de espera há três meses.

Segundo a coordenadora da Central de Transplantes do Ceará, Eliana Barbosa, todos os transplantados reagiram bem. Ela explica que ainda falta o transplante da córnea. “Infelizmente, apenas uma foi captada. No outro olho houve muito dano por causa da bala que atravessou o crânio (da estudante)”, diz. Ainda conforme a coordenadora, a córnea que está em bom estado será encaminhada hoje para a Central de Transplantes, que irá definir o nome do receptor. Nesse caso, será a pessoa com mais tempo na fila de espera.

Já no caso do fígado, além da compatibilidade sanguínea, o critério é a gravidade do estado de saúde do paciente. “A gente sabia que não tinha cura para a doença dele. Só mesmo o transplante. É por isso que agradeço a família (da Nádia), que teve serenidade para fazer a doação em um momento de dor”, diz Francisca Aparecida, mulher de Marco Antonio.

O chefe do serviço de transplante de fígado do HUWC, Huygens Garcia, confirma que o paciente está bem. “Como ele está respondendo bem, deve receber alta em oito dias”, informa. “Foi uma vitória muita grande, graças a Deus e ao trabalho dos médicos, que me atenderam muito bem”, agradece Marco Antonio.

O cearense é solidário. Apesar da dor, a família de Nádia sabia que ela queria continuar fazendo o bem. Era uma pessoa muito querida na universidade”, avalia a coordenadora da Central de Transplantes. Eliana Barbosa explica que os órgãos doados são distribuídos de acordo com critérios como tempo na fila de espera, compatibilidade genética e gravidade da doença.

A estudante universitária Nádia Brito foi morta por um tiro, depois da aula de quarta-feira à noite, enquanto esperava o ônibus de volta para casa, em uma parada próximo à Universidade Estadual do Ceará (Uece).
>Francisco Carlos Barbosa Ribeiro, 50, cabo da PM, foi indiciado por homicídio doloso. Ele estava em uma van que transportava torcedores do Fortaleza e foi apedrejada por torcedores do Ceará, na parada onde Nádia esperava o ônibus. O cabo teria atirado três vezes. Um dos disparos teria atingido Nádia na cabeça.
>Durante o enterro de Nádia, parentes e amigos evitavam falar com a imprensa em repúdio à abordagem desrespeitosa que alguns veículos adotaram em matérias e no contato com a família. Alguns noticiaram a morte da menina no mesmo dia do incidente.
>Na noite de sexta-feira, amigos e estudantes da Uece fizeram manifestação na avenida Dedé Brasil. Caminharam do campus do Itaperi até a parada de ônibus onde a jovem foi morta. A manifestação parou o trânsito no local por dez minutos.
>Morte cerebral (ou encefálica) é a parada definitiva e irreversível do cérebro, provocando em poucos minutos a falência de todo o organismo. Os médicos podem manter os órgãos funcionando durante algum tempo por meio de medicamentos ou de aparelhos.
>Transplante é um procedimento cirúrgico que consiste na reposição de um órgão ou tecido de um pessoa doente (chamado de receptor) por outro órgão ou tecido normal de um doador (que pode estar vivo ou morto).
>Os transplantes do coração e do fígado foram realizados na última sexta-feira, no Hospital do Coração de Messejana e no Hospital Universitário Walter Cantídio (HUWC), respectivamente. Os dos rins foram realizados ontem. Um deles foi transplantado no Hospital Geral de Fortaleza (HGF) e o outro no HUWC.

>Inicialmente, a equipe da Central de Transplantes achava que seis pessoas seriam beneficiadas com a doação dos órgãos de Nádia. Mas como apenas uma das córneas pode ser aproveitada, esse número diminuiu para cinco.