sexta-feira, 20 de novembro de 2009

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Saúde
Paraná tem queda no número de transplantes
No caso do pâncreas/rim, diminuição chegou a 81%. Gripe suína foi um dos motivos.

Publicado em 19/11/2009 Aline Peres e Jennifer Koppe

A queda do número de transplantes de coração, pâncreas/rim e medula óssea, percebida nos últimos meses pelos hospitais de Curitiba, tem causado preocupação.

Segundo registros da Associa­­ção Brasileira de Transplantes de Órgãos (ABTO), de janeiro a setembro deste ano o Paraná registrou queda de 33% no número de transplantes de coração em relação ao mesmo período do ano passado. O de pâncreas/rim caiu 81% e o de medula óssea, 43%. Os únicos procedimentos que apresentaram aumento em 2009 foram de rim (17%) e de fígado (18%).
Quatro fatores são apontados como os principais responsáveis pelo quadro:
a gripe A (H1N1), que lotou as unidades de tratamento intensivo (UTI) dos hospitais;
o baixo número de notificações de potenciais doadores pelas equipes médicas à Central Estadual de Transplantes (CET);
a falta de valorização e capacitação dos profissionais responsáveis pela captação e manejo de órgãos;
e os problemas na abordagem às famílias que, por sua vez, ainda não têm consciência da importância da doação de órgãos.
Mudanças podem aumentar a captação

A assistente social Edi Gláucia Repula, da Central de Trans­plan­tes, diz que algumas medidas estão sendo tomadas ainda este ano para melhorar o número de doações no estado.
Hora delicada
Falta informação às famílias
A intensificação de programas de conscientização da população é uma solução apresentada pelo cirurgião cardíaco Sérgio Lopes, da Santa Casa, para melhorar os números relativos aos transplantes. “Ainda não sabemos lidar muito bem com a questão da morte. A maioria das famílias não sabe se o paciente é doador de órgãos ou não. É importante conversar sobre o assunto em vida. Todo paciente é potencial doador por lei, mas nós, médicos, não podemos passar por cima da decisão da família”, lembra.
A assistente social da Central Estadual de Transplantes Edi Gláucia Repula conta que, durante uma semana, a central ficou sem receber nenhuma doação de córnea. A recusa das famílias em doar os órgãos do paciente falecido é o principal motivo apontado por ela. “Entre os meses de setembro a outubro, 40% das famílias abordadas optaram por não doar os órgãos”, conta.
O vereador Zé Maria (PPS) propôs um projeto de lei na Câmara Municipal de Curitiba para incrementar as campanhas de esclarecimento dentro das instituições de saúde. Na opinião dele, médicos e enfermeiros envolvidos diretamente com as famílias de potenciais doadores seriam mais competentes na abordagem, se fossem treinados a esclarecer dúvidas sobre como ocorre a morte encefálica, aspectos éticos da doação e sobre a troca de experiências da família do doador com a do receptor. (AP e JK)
Muito a melhorar ainda
Segundo o presidente da Associa­ção Brasileira de Transplantes de Órgãos (ABTO), Valdir Garcia Duro, o Paraná ainda não conseguiu atingir a sua meta, que é de 10 doadores ativos por milhão de habitantes até 2010 – hoje são apenas 6,4. Espírito Santo e Minas Gerais já alcançaram esse número, en­­quanto São Paulo e Santa Catarina já estão em 17 por 1 milhão.
Na opinião do médico, uma central de transplantes atuante, intensivistas motivados e treinados, equipes de captação que trabalhem 24 horas e famílias bem orientadas fazem parte deste pacote.
De acordo com o relatório apresentado pela Central Estadual de Transplantes, o estado está, lentamente, dando sinais de melhora. No último ano, o número de notificações subiu 5% e de doadores efetivos, 42%. Porém, o número de doadores de múltiplos órgãos caiu em torno de 17%. Ou seja, nem todos os órgãos dos doadores estão sendo aproveitados para os transplantes. (AP)
Enquanto isso, 4.161 pacientes aguardam na fila de espera por um órgão. Caso do assistente comercial aposentado Raimun­do Nonato de Souza, 46 anos, que sofre de insuficiência renal crônica desde 2002 e está há mais de três anos na fila dos transplantes à espera de um rim. Desde que descobriu a doença, Raimundo precisa se submeter a sessões de hemodiálise, na Santa Casa de Miseri­córdia de Curitiba, três vezes por semana. “Preciso do transplante para poder me livrar da máquina, mas, como eu não tenho nenhum doador compatível na família, o jeito é esperar. Não sei quando vou conseguir. Dizem que pode demorar 5, até 7 anos”, conta.
Em vários hospitais do estado, entre eles a Santa Casa, o númerode doações de órgãos caiu significativamente em 2009. Segundo o cirurgião cardíaco Sérgio Lopes, o número de transplantes cardíacos realizados pela instituição – que é referência neste tipo de procedimento – caiu 50%. Nos últimos onze meses, o hospital realizou 12 transplantes de coração. Durante o mesmo período do ano passado, tinha feito 24. Os transplantes de rim e de fígado também registraram queda em relação a 2008.
Lopes conta que, durante o surto da gripe suína, o hospital ficou dois meses sem realizar nenhum pro­­cedimento. “Como as UTIs es­­tavam lotadas de pacientes infectados com o vírus, não tínhamos condições de receber nenhum pa­­ciente em pré-transplante.

O surto passou, mas não houve recuperação nas doações, principalmente de coração. Acredito que o principal problema esteja na falta de profissionais capacitados para manejar os órgãos. O coração é muito mais sensível do que o fígado, o rim ou a córnea”, lembra.
Valorizar os médicos intensivistas, que em muitos casos são responsáveis por comunicar à central a existência de doadores, é fundamental, segundo ele. “Hoje, menos de 50% das notificações se tornam doações efetivas. O papel desses profissionais também é muito importante para que todo o sistema funcione”, explica.
Sem registros

Os hospitais Evangélico, das Clíni­cas e Angelina Caron também ti­ve­­ram queda no número de transplantes. No Evangélico, não há re­­gistro de transplantes desde setembro. Até agosto, apenas 16 procedimentos foram realizados. No mesmo período de 2008, foram 19.
Já o Hospital Angelina Caron, em Campina Grande do Sul, fez apenas cinco transplantes de órgãos em 2009. Nos meses de se­­tembro e outubro, a instituição não recebeu nenhum órgão pela cen­­tral. O chefe da equipe da Ne­­fro­­logia do hospital, o médico Car­­los Gustavo Marmanillo, também cita problemas no processo de captação e a gripe A como os principais fatores que influenciaram a falta de órgãos para transplantes. “A gripe gerou muita fo­­bia na população. Além disso, to­­das as cirurgias entre vivos marcadas du­­rante julho e agosto tiveram de ser remarcadas para não superlotar as UTIs”, conta.

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