terça-feira, 19 de maio de 2009

Hepatites

GAZETA

DE PIRACICABA

Cidade
Doença silenciosa

Chapéu Chapéu Hepatite C, a mais grave, pode demorar 20 anos para apresentar os primeiros sintomas

ADRIANA FEREZIM
Especial para a Gazeta

Comemorado hoje, 19 de maio, o Dia Mundial de Combate às Hepatites Virais, foi criado pela Organização Mundial de Saúde para alertar e informar sobre essa doença, que compromete o fígado e raramente apresenta sintomas. Por esse motivo, a maioria das pessoas não sabe que tem o vírus e quando descobre, cerca de 20 anos após a contaminação, o órgão já apresenta sinais de insuficiência, cirrose e câncer hepático.

Atualmente, são conhecidos cinco tipos da doença, denominados de A, B, C, D e E. De acordo com a ONG Grupo Otimismo, mundialmente, os tipos B e C da doença atingem 520 milhões de pessoas, número 13 vezes maior que a epidemia de Aids. "Só no Brasil, cerca de quatro milhões de pessoas podem estar infectadas com o vírus da hepatite C e dois milhões com o vírus B. No entanto, mais de 95% ainda desconhecem que estão doentes e podem conviver com sérias complicações hepáticas".

O Ministério da Saúde esclarece que, em 2008, foram notificados 9.993 casos de hepatite B e de 10.665 de hepatite C. Neste ano, até o início de maio já foram registrados 4.779 casos de hepatite B e 2.839 de hepatite C.

Em Piracicaba, no primeiro trimestre deste ano, foram registrados oito casos de hepatite no Centro de Doenças Infecto Contagiosas (Cedic). Desses, dois são do tipo B, o restante é da C, a mais grave, porque em cada dez casos, oito se tornam crônicos (evoluem para cirrose e câncer do fígado) e a taxa de cura é de 50%, informa a médica Waleska Valéria Lobo Farias Germano, infectologista do Cedic Piracicaba e do Hospital Emílio Ribas, de São Paulo.

Em 2007, o Cedic registrou 54 casos de hepatite, sendo 13 da B e 41 da C. No ano passado, foram 94 pessoas diagnosticadas, sendo 14 com o tipo B, 78 com a C e dois casos que tinham os dois vírus, o B e o C.

O Cedic solicita que as pessoas que tiverem sido diagnosticadas com hepatite B ou C, na década entre 1990 e 2000, que procurem a unidade, na rua do Trabalho, porque um novo medicamento está disponível.

IDADE. O MS revela que uma análise dos casos confirmados no Sistema de informação de Agravos de Notificação (Sinan), entre 1999 e 2008, indica o predomínio de casos da hepatite C no Brasil na faixa etária entre 30 e 69 anos. Na pesquisa de pacientes com hepatite B, ocorre maior número de casos em pessoas com idade entre 20 e 59 anos.

A médica do Cedic alerta que estão no grupo de risco de ter a doença do tipo B ou C, sem saber, pessoas que até 1993 receberam transfusão de sangue, foram tratadas com seringas de vidro e agulhas de metal na infância e hoje têm mais de 40 anos, uso de alicate compartilhado e sem esterilização adequada em manicures, uso de equipamentos também infectados em dentistas e relações sexuais sem proteção (infectatos por esse motivo são mais raros na C e mais comuns no tipo B), usuários de drogas injetáveis ou aspiradas, tatuagens, piercings, pessoas que fazem hemodiálise, entre outros, inclusive profissionais de saúde, que podem se ferir no trabalho.

Mas as pessoas que não se enquadram nesses perfis também estão suscetíveis à infecção. "Em uma parcela dos pacientes não é detectada a origem da contaminação. É preciso ficar atento e fazer exames de rotina. O que faz o diagnóstico da hepatite é um exame de sangue específico. As pessoas, se suspeitarem que podem estar contaminadas, devem lembrar ao médico sobre a doença e solicitar que ele indique o exame", orienta Waleska.

O vírus da hepatite B é muito resistente. "Fora do organismo ele consegue sobreviver por quase cinco dias. Não é como o HIV, o vírus da Aids, que fora do corpo humano morre em aproximadamente dez minutos", disse.

Para todas as hepatites há tratamento e chance de cura. Para a hepatite B existe vacina disponível no Sistema Único de Saúde (SUS). A vacinação é atualmente feita em bebês e está disponível para jovens até 19 anos gratuitamente.

A médica explica que 90% das pessoas com hepatite B conseguem a cura e 10% se torna crônica, levando a insuficiência hepática e evoluindo para cirrose e câncer de fígado. Nesses dois últimos casos o único tratamento é o transplante do órgão. A expectativa de vida em pacientes crônicos, em qualquer tipo de hepatite, pode variar de 10 a 20 anos.

Dados do Ministério da Saúde indicam que foram realizados no país, em 2008, 1.110 transplantes de fígado, mas informou que não é possível informar quantos foram realizados em virtude de pacientes com hepatite.

A Secretaria de Estado da Saúde informou que há atualmente 76 pacientes em tratamento de hepatite C em Piracicaba e 213 na região. Com hepatite B, há 20 pessoas na cidade e 38 na região recebendo gratuitamente os medicamentos que são de alto custo. "O tempo de tratamento varia de acordo com o que o médico achar necessário. No caso da hepatite C, existe um protocolo do MS e do Estado que, estipula o recebimento do medicamento por até um ano", informou a assessoria de imprensa.

CRIANÇAS. O tipo A é mais comum em crianças e tem transmissão fecal e oral, geralmente por verduras mal-lavadas e água sem tratamento adequado, segundo a médica Waleska. É comum surtos em creches e, nesses casos, o governo oferece vacinação, caso contrário a vacina é oferecida na rede privada.

"A hepatite A apresenta como sintomas: febre não muito alta, em torno de 38,5 graus, dor abdominal e muscular, seguido de náusea, falta de apetite, e icterícia (cor amarelada observada nos olhos e também na pele)".

A luta e a dor de uma família

Na adolescência um jovem se machucou jogando futebol. O quadro clínico se complicou e ele precisou de transfusão de sangue. Vinte e três anos depois ele descobriu que tinha cirrose por causa do vírus da hepatite C. Morreu há pouco mais de um mês, aos 41 anos, deixando a esposa e filhas. A família pediu para não ser identificada, mas concedeu entrevista à Gazeta, como forma de alertar as pessoas sobre a doença.

"A hepatite C foi descoberta há três anos. Os sintomas começaram com perda de peso, dores abdominais e icterícia (pele amarelada). Foram diagnosticadas a cirrose e a hepatite C. Ele fez o tratamento e o vírus negativou. Um ano depois, a doença voltou e novo tratamento foi efetuado. Mais uma vez o estado clínico se normalizou, tanto que ele nem entrou na fila do transplante de fígado", relata a esposa.

Ele fazia o monitoramento da doença quando adoeceu e em um mês morreu.

"Ele teve uma crise da hepatite, com dor de cabeça, voltou a icterícia e febre. O quadro evoluiu para insuficiência múltipla. Foi de repente", conta.

Ela critica a falta de esclarecimento, de uma campanha ampla por parte do governo, para que as pessoas se previnam, façam o tratamento antes da doença comprometer o fígado. "Conheço jovens que descobriram ser portadores do vírus da hepatite C quando foram doar sangue. Nesses casos, o tratamento resolveu. O transplante é mais caro, o afastamento da pessoa do trabalho, enquanto está tomando os medicamentos também. Acompanhei meu marido, amparei ele nos momentos das reações do medicamento. Senti sua dor e apesar de toda luta, a doença venceu".

NÚMERO

94 pessoas foram notificadas com a hepatite B e C em Piracicaba, em 2008

Palestra alerta sobre a doença

A advogada Tania Penteado Bragado, 47, descobriu em 1998, em um exame de rotina, que estava com uma alteração no fígado. O problema foi investigado e ela foi diagnosticada com hepatite C. Fez dois tratamentos e vai completar quatro anos que negativou o vírus no organismo. Para chegar até essa boa notícia, o caminho foi difícil, de muito sofrimento e perseverança.

Ela contraiu a doença por transfusão de sangue, 17 anos antes de descobrir que tinha o vírus. "Aos 19 anos, sofri um acidente de carro e precisei de oito litros de sangue", fala.

Ela conta que depois de descobrir ser portadora do vírus HCV, começou uma série de procedimentos para iniciar o tratamento. "Primeiro precisei fazer uma biópsia do fígado, mas por causa das cirurgias do acidente, quando a equipe médica foi realizar o exame, tive hemorragia interna".

Ela não pode fazer esse exame, que é uma das exigências do protocolo da doença para o SUS fornecer o medicamento, que é de alto custo. "Como não pude fazer a biópsia, fiquei fora do padrão. Entrei com mandato de segurança e obtive os remédios".

Para se ter uma ideia do custo, em 2006, o tratamento, dos dois medicamentos indicados para o tratamento da hepatite C, custava o equivalente a R$ 8.000/mês.

REAÇÕES. Tania perdeu muito peso, teve queda de cabelo (quase ficou careca) e muita irritabilidade, dores musculares e náuseas. "Tudo isso é provocado pelo medicamento. É importante a compreensão e o apoio da família nesse momento", explica.

Negativou o vírus, mas, após três anos, a doença voltou. Deram-lhe 10 anos de vida.

Um médico, do Hospital São Paulo, com quem tinha contato, indicou um medicamento novo, que acabara de ser lançado. "Tive de conseguir o remédio por mandato de segurança. Fiz todo o tratamento, passei novamente por todas as reações e hoje estou aqui e disposta a informar e alertar a todas as pessoas sobre a doença".

A advogada tem feito palestras sobre sua experiência e para divulgar a hepatite C. "As pessoas precisam saber que não devem tirar a cutícula, não devem compartilhar a escova de dentes, aparelhos de barbear ou depilar. Minha luta hoje é alertar que existem milhares de pessoas com a doença, sem saber, e que os doentes não devem ter preconceito, porque ela não transmite no contato, no beijo, no abraço", afirma.

No período em que estava com a doença e não sabia, Tania se casou e teve dois filhos. "Corri o risco de transmitir o vírus a eles. Graças a Deus eles não têm nada".

Tania se coloca a disposição das pessoas que estiverem em tratamento e necessitarem de apoio. Telefone: 3422-2187.




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