Cientistas descobrem o local exato do nascimento das células-tronco adultas hematopoéticas
O achado pode viabilizar uma espécie de autotransplante, diminuindo as chances de complicações Paloma Oliveto
Publicação: 23/02/2010 07:00 Atualização: 23/02/2010 12:54
Uma descoberta de cientistas norte-americanos pode significar, no futuro, a cura para doenças que atacam o plasma, como leucemia, diabetes tipo 2, mielomas múltiplos (tumores que atingem a medula óssea), linfomas e anemia falciforme. Pela primeira vez, eles conseguiram localizar a região onde os vertebrados produzem células-tronco adultas hematopoéticas (CTH), que têm apresentado os melhores resultados, até agora, nas terapias contra doenças autoimunes. Essas estruturas são aquelas com capacidade de se autorrenovar e se diferenciar em diversos tipos de células sanguíneas e do sistema imunológico Hoje, o grande problema para os pacientes é a dificuldade de encontrar doadores compatíveis, o que, muitas vezes, inviabiliza o transplante.
Com o experimento realizado no câmpus de San Diego da Universidade da Califórnia, a rejeição estaria descartada, já que as células-tronco poderiam ser retiradas do próprio indivíduo. Publicada na edição online da revista Nature, a pesquisa é apontada como o primeiro passo para o desenvolvimento de terapias mais seguras e efetivas.
Embora alguns cientistas já desconfiassem que as CTH seriam formadas na aorta dorsal, o processo do nascimento e desenvolvimento das células jamais havia sido observado. Para constatar que realmente é nessa região que elas surgem, os pesquisadores utilizaram o embrião de um peixe-zebra. Por ser bastante transparente, a estrutura permite uma boa visualização — a equipe conseguiu, inclusive, filmar o momento em que as CTH se desenvolvem. “Um grande número de estudos conflituosos já havia proposto diferentes locais de origem, o que deixava a questão controversa. Usando luz fosforescente sobre o tecido dos embriões do peixe-zebra, porém, conseguimos identificar o local exato do crescimento das células-tronco hematopoéticas , que ocorre diretamente na aorta dorsal”, disse ao Correio David Traver, professor de biologia e principal autor do estudo.
De acordo com ele, se for possível gerar CTHs saudáveis dos pacientes doentes e então transplantá-las para suas próprias medulas ósseas, muitas complicações poderiam ser evitadas. “Nossa descoberta é um passo importante para atingir esse objetivo, porque fornece um melhor entendimento sobre como as células-tronco hematopoéticas se tornam o que são. Com isso, será possível induzir as células-tronco pluripotentes, aquelas capazes em se transformar em qualquer tecido, a se transformarem em CTHs, algo que, atualmente, não acontece”, explica. “Em outras palavras, estamos um passo mais próximos de entender como gerar clinicamente as CTHs para uso terapêutico, a partir das células pluripotentes.”
Uma das grandes vantagens de uma terapia à base das próprias células do indivíduo é evitar a rejeição. Os transplantes atuais dependem da infusão das células-tronco de um doador na medula óssea do paciente, para gerar novas células saudáveis. Porém, o procedimento é frequentemente arriscado e pode resultar em complicações fatais, em parte, devido à “doença do transplante contra o hospedeiro”, que ocorre quando há rejeição, e os linfócitos T atacam os tecidos da pessoa que recebe as células.
Mais avanços
Outra pesquisa publicada neste mês no jornal da Federação Norte-americana das Sociedades para Biologia Experimental poderá combater também a rejeição do transplante de medula óssea. Usando células de ratos, cientistas dos Estados Unidos e do Irã descobriram uma nova estratégia para fazer os transplantes de células-tronco embrionárias menos suscetíveis à rejeição pelo sistema imunológico do receptor. A tecnologia consiste na fusão de células da medula com as embrionárias. Uma vez juntas, as células híbridas contêm o DNA tanto do doador quanto do receptor, aumentando a esperança de que não seja necessário o uso de medicações fortes para evitar que o organismo do paciente considere a doação um corpo estranho.
“Nosso estudo mostrou que as células transplantadas da medula óssea podem se fundir não apenas com as semelhantes, mas também com as não hematopoéticas, sugerindo que, se pudermos entender melhor o processo dessa fusão, talvez consigamos tratar várias doenças com as células-tronco da medula óssea do próprio paciente”, disse, no estudo, o pesquisador Nicholas Zavazava, da Universidade de Iowa. Ele lembra porém que, apesar de serem extremamente promissores para as futuras terapias com células-tronco embrionárias, os resultados podem demorar um longo tempo para serem colocados na prática.
O professor e os demais pesquisadores envolvidos usaram duas distensões musculares retiradas de ratos. Uma do doador e outra do receptor. Quando as células-tronco da medula óssea foram transplantadas, eles verificaram que, no organismo do camundongo que recebeu as estruturas, havia três diferentes tipos de células: a do doador, a do receptor e as fundidas, cujo DNA era composto por ambos os ratos. Os cientistas, então, descobriram que essas células podem se fundir com diferentes tipos, incluindo as dos rins, do coração, do fígado e do intestino. Embora seja preciso mais trabalho para determinar as utilidades clínicas da experiência, a descoberta aumenta a possibilidade de as células-tronco embrionárias se fundirem para transplantar órgãos de forma a evitar a rejeição. Outra possibilidade é fundi-las a órgãos em falência para ajudá-los a se regenerar.
“Diferentemente de máquinas, nas quais uma mesma peça pode ser usada para diferentes modelos e funções, os seres humanos são personalizados, e nosso sistema imune faz o controle de qualidade”, diz Gerald Weissmann, no editorial da publicação. “Como resultado, as partes do corpo ou os órgãos transplantados precisam ser muito parecidos com o padrão imunológico do receptor. Essa pesquisa usa células-tronco da medula óssea para fundi-las com tecidos do paciente, de forma que nada do que for transplantado possa seja rejeitado pelo sistema imunológico”, elogiou, no texto.
De acordo com o Instituto Nacional do Câncer (Inca), vinculado ao Ministério da Saúde, neste ano deverão surgir 9.580 novos casos de leucemia no Brasil. Em dezembro de 2008, o Registro Nacional de Doadores Voluntários de Medula Óssea (Redome) conseguiu cadastrar 960 mil doadores mas, apesar de crescente, o número é considerado insuficiente para atender a todos os pacientes que precisam do transplante, principalmente pelo fato de a probabilidade de se achar um doador transplante, principalmente pelo fato de a probabilidade de se achar um doador compatível no Brasil ser de um em 100 em mil.
Veja como funcionam as células-tronco
O achado pode viabilizar uma espécie de autotransplante, diminuindo as chances de complicações Paloma Oliveto
Publicação: 23/02/2010 07:00 Atualização: 23/02/2010 12:54
Uma descoberta de cientistas norte-americanos pode significar, no futuro, a cura para doenças que atacam o plasma, como leucemia, diabetes tipo 2, mielomas múltiplos (tumores que atingem a medula óssea), linfomas e anemia falciforme. Pela primeira vez, eles conseguiram localizar a região onde os vertebrados produzem células-tronco adultas hematopoéticas (CTH), que têm apresentado os melhores resultados, até agora, nas terapias contra doenças autoimunes. Essas estruturas são aquelas com capacidade de se autorrenovar e se diferenciar em diversos tipos de células sanguíneas e do sistema imunológico Hoje, o grande problema para os pacientes é a dificuldade de encontrar doadores compatíveis, o que, muitas vezes, inviabiliza o transplante.
Com o experimento realizado no câmpus de San Diego da Universidade da Califórnia, a rejeição estaria descartada, já que as células-tronco poderiam ser retiradas do próprio indivíduo. Publicada na edição online da revista Nature, a pesquisa é apontada como o primeiro passo para o desenvolvimento de terapias mais seguras e efetivas.
Embora alguns cientistas já desconfiassem que as CTH seriam formadas na aorta dorsal, o processo do nascimento e desenvolvimento das células jamais havia sido observado. Para constatar que realmente é nessa região que elas surgem, os pesquisadores utilizaram o embrião de um peixe-zebra. Por ser bastante transparente, a estrutura permite uma boa visualização — a equipe conseguiu, inclusive, filmar o momento em que as CTH se desenvolvem. “Um grande número de estudos conflituosos já havia proposto diferentes locais de origem, o que deixava a questão controversa. Usando luz fosforescente sobre o tecido dos embriões do peixe-zebra, porém, conseguimos identificar o local exato do crescimento das células-tronco hematopoéticas , que ocorre diretamente na aorta dorsal”, disse ao Correio David Traver, professor de biologia e principal autor do estudo.
De acordo com ele, se for possível gerar CTHs saudáveis dos pacientes doentes e então transplantá-las para suas próprias medulas ósseas, muitas complicações poderiam ser evitadas. “Nossa descoberta é um passo importante para atingir esse objetivo, porque fornece um melhor entendimento sobre como as células-tronco hematopoéticas se tornam o que são. Com isso, será possível induzir as células-tronco pluripotentes, aquelas capazes em se transformar em qualquer tecido, a se transformarem em CTHs, algo que, atualmente, não acontece”, explica. “Em outras palavras, estamos um passo mais próximos de entender como gerar clinicamente as CTHs para uso terapêutico, a partir das células pluripotentes.”
Uma das grandes vantagens de uma terapia à base das próprias células do indivíduo é evitar a rejeição. Os transplantes atuais dependem da infusão das células-tronco de um doador na medula óssea do paciente, para gerar novas células saudáveis. Porém, o procedimento é frequentemente arriscado e pode resultar em complicações fatais, em parte, devido à “doença do transplante contra o hospedeiro”, que ocorre quando há rejeição, e os linfócitos T atacam os tecidos da pessoa que recebe as células.
Mais avanços
Outra pesquisa publicada neste mês no jornal da Federação Norte-americana das Sociedades para Biologia Experimental poderá combater também a rejeição do transplante de medula óssea. Usando células de ratos, cientistas dos Estados Unidos e do Irã descobriram uma nova estratégia para fazer os transplantes de células-tronco embrionárias menos suscetíveis à rejeição pelo sistema imunológico do receptor. A tecnologia consiste na fusão de células da medula com as embrionárias. Uma vez juntas, as células híbridas contêm o DNA tanto do doador quanto do receptor, aumentando a esperança de que não seja necessário o uso de medicações fortes para evitar que o organismo do paciente considere a doação um corpo estranho.
“Nosso estudo mostrou que as células transplantadas da medula óssea podem se fundir não apenas com as semelhantes, mas também com as não hematopoéticas, sugerindo que, se pudermos entender melhor o processo dessa fusão, talvez consigamos tratar várias doenças com as células-tronco da medula óssea do próprio paciente”, disse, no estudo, o pesquisador Nicholas Zavazava, da Universidade de Iowa. Ele lembra porém que, apesar de serem extremamente promissores para as futuras terapias com células-tronco embrionárias, os resultados podem demorar um longo tempo para serem colocados na prática.
O professor e os demais pesquisadores envolvidos usaram duas distensões musculares retiradas de ratos. Uma do doador e outra do receptor. Quando as células-tronco da medula óssea foram transplantadas, eles verificaram que, no organismo do camundongo que recebeu as estruturas, havia três diferentes tipos de células: a do doador, a do receptor e as fundidas, cujo DNA era composto por ambos os ratos. Os cientistas, então, descobriram que essas células podem se fundir com diferentes tipos, incluindo as dos rins, do coração, do fígado e do intestino. Embora seja preciso mais trabalho para determinar as utilidades clínicas da experiência, a descoberta aumenta a possibilidade de as células-tronco embrionárias se fundirem para transplantar órgãos de forma a evitar a rejeição. Outra possibilidade é fundi-las a órgãos em falência para ajudá-los a se regenerar.
“Diferentemente de máquinas, nas quais uma mesma peça pode ser usada para diferentes modelos e funções, os seres humanos são personalizados, e nosso sistema imune faz o controle de qualidade”, diz Gerald Weissmann, no editorial da publicação. “Como resultado, as partes do corpo ou os órgãos transplantados precisam ser muito parecidos com o padrão imunológico do receptor. Essa pesquisa usa células-tronco da medula óssea para fundi-las com tecidos do paciente, de forma que nada do que for transplantado possa seja rejeitado pelo sistema imunológico”, elogiou, no texto.
De acordo com o Instituto Nacional do Câncer (Inca), vinculado ao Ministério da Saúde, neste ano deverão surgir 9.580 novos casos de leucemia no Brasil. Em dezembro de 2008, o Registro Nacional de Doadores Voluntários de Medula Óssea (Redome) conseguiu cadastrar 960 mil doadores mas, apesar de crescente, o número é considerado insuficiente para atender a todos os pacientes que precisam do transplante, principalmente pelo fato de a probabilidade de se achar um doador transplante, principalmente pelo fato de a probabilidade de se achar um doador compatível no Brasil ser de um em 100 em mil.
Veja como funcionam as células-tronco