BAHIA
Colapso afeta medicamentos e ameaça vida de pacientes com doenças
crônicas
Portadores de doenças crônicas esperam na fila pelos remédios de alto
custo que, pela lei, eles deveriam ter acesso
Jairo Costa Júnior (jairo.junior@redebahia.com.br)
19/08/2014 07:44:00 Atualizado em 19/08/2014
08:01:56
Aos 58
anos, o ator Gideon Rosa encarna todo mês o mesmo papel há quase um ano: o do
portador de doença renal crônica que lota filas de unidades médicas à espera de
um medicamento que não vem e sem o qual pode morrer.
Só que, diferentemente
das interpretações que lhe renderam cinco prêmios Braskem e um Copene de Teatro
- entre dezenas de outros -, Gideon virou protagonista do próprio drama, cuja
realidade é vivida todo dia por pacientes que dependem do programa de remédios
de alto custo dos governos federal e estadual, tocado pela Secretária de Saúde
da Bahia (Sesab).
Sem os dois rins, o
premiado ator Gideon Rosa enfrenta a via-crúcis de quem tenta obter
medicamentos de alto custo nas farmácias públicas (Foto: Acervo Pessoal)
Também
dramaturgo, jornalista e crítico de teatro e dança, com passagens pelo CORREIO,
Tribuna da Bahia e TV Aratu, Gideon é portador de rins policísticos. A doença,
hereditária, se caracteriza pelo crescimento anormal de cistos nos rins ao
longo da vida adulta.
No caso do ator baiano, ele já não os possui mais. “Um rim eu
tirei quando ele tinha seis quilos. O segundo, quando chegou a cinco quilos”,
conta. Para complementar a hemodiálise, o ator precisa de medicamentos
especializados de forma regular.
A maioria das substâncias prescritas para pacientes renais
crônicos e transplantados tem valor elevado. Podem custar de R$ 50 a mais de R$
900.
Por isso, o Ministério da Saúde criou o programa de medicamentos
de alto custo, voltado a garantir sobrevida e tratamento digno não só aos
portadores de enfermidades nefrológicas, mas também para transplantados e
pessoas acometidas por mal de Parkinson, lúpus, fibrose cística, fibromialgia e
doenças cardiovasculares graves. Desde que, é claro, comprovem não ter condições
de bancar a conta da farmácia particular.
Pelas
regras do ministério, todos os pacientes selecionados e inscritos na Sesab
deveriam ter acesso, com regularidade, ao elenco de medicamentos de alto custo
bancado com verbas públicas. No total, 80 tipos de remédios são comprados ou
financiados diretamente pelo governo federal. Outros 54 são de competência do
estado. Contudo, regular é um adjetivo cada vez mais distante da realidade da
Sesab em relação à assistência farmacêutica.
Atrasos
Com o esvaziamento da política de transplantes do SUS na Bahia,
Gideon Rosa resolveu se mudar para Itabuna, no Sul do estado, cidade vizinha a
Buerarema, onde nasceu. Além da proximidade com a família, o ator escolheu o
município baiano em que a possibilidade de receber um rim é a mais alta em
relação ao resto da Bahia, incluindo a capital. Ele só não esperava que outro
problema comum o acompanhasse nesse retorno forçado às origens.
“Há
oito meses, eu tento buscar o Calcitriol, medicamento fundamental para o doente
renal crônico, mas não consigo. Eu frequento mensalmente a farmácia da 7ª Dires
(Diretoria Regional de Saúde, engloba mais de 20 municípios do Sul baiano), que
oferece os chamados remédios de alto custo. Lá, quando a vida está no limite, a
lista de remédios que estão em falta há mais de meio ano é enorme. Uma
realidade escandalosa, porque a maioria absoluta desses remédios não existe nas
farmácias convencionais. E quando existe, não dá para qualquer pessoa comprar”,
afirma, ao citar o Calcitriol, que custa R$ 80 (a caixa com 30 comprimidos).
Nas
filas mensais da Dires, Gideon conta ter visto e ouvido histórias tão tristes
quanto às que viveu nos palcos. Uma delas, lembra, foi contada por uma
farmacêutica da unidade. Segundo o ator, uma senhora buscava há seis meses um
remédio de alto custo para tratar a doença pulmonar grave em sua filha.
“Ela sempre voltava lá e sempre ouvia: ‘Não tem, volta na
próxima semana’. Um dia, essa farmacêutica ligou para essa mulher toda feliz
para avisar que a medicação havia chegado, enfim, mas a senhora respondeu:
‘Agora, tá difícil, ela já está na glória do Senhor’”, narra.
Associações
A falta de medicamentos de alto custo para pacientes de risco é
uma velha conhecida das associações que reúnem portadores de doenças crônicas,
do lúpus à fibrose cística, passando por fibromialgia e esquizofrenia, fora pacientes
transplantados ou acometidos por dores agudas. “Mas, nos últimos dois ou três
anos, isso se tornou constante. Resolve um mês, mas falta no outro”, afirma
Gérson Brasil, um dos mais ativos porta-vozes dos renais crônicos no estado.
Gérson fala com a experiência das idas e vindas em busca de
medicamentos e do contato direto com parte dos oito mil renais crônicos no
estado - segundo estimativa do Ministério da Saúde, considerada tímida pelo
diretor da Associação dos Renais Crônicos do Estado da Bahia (Acerba).
Em
Salvador, a entrega de remédios de alto custo para os portadores de
doenças nos rins é feita no Hospital Ana Nery, na Caixa D’Água. A reportagem
não obteve acesso autorizado à unidade, mas foi possível ver pessoas saindo das
filas sem os medicamentos.
Na falta
Na lista de alto custo, há dois medicamentos importantes que
deveriam ser fornecidos pelo governo, mas não são. Um deles é o Clopidogrel,
indicado para a prevenção de infarto agudo do miocárdio, acidente vascular
cerebral, angina e para pessoas submetidas a cirurgias cardíacas.
O outro, a Gabapentina, é anticonvulsionante e analgésico,
indicado para quem sofre de dor crônica. Ambos custam em média R$ 60 e R$ 25,
respectivamente. Parece, à primeira vista, pouco, desde que se tenha recursos e
que não seja preciso usá-los ao longo da vida, perfil da maioria dos
brasileiros.
Excesso de ações na
Justiça e sobrecarga na rede
Em entrevista ao CORREIO, o diretor da Assistência Farmacêutica
da Sesab, Lucas Duarte, atribui parte da crise na distribuição de medicamento
de alto custo ao excesso de judicialização. Duarte afirma que existe hoje uma
grande quantidade de ações na Justiça impetradas por portadores de doenças para
obrigar o governo do estado a garantir o fornecimento de medicamentos, parte
inscrita no elenco do SUS, parte não adotada pelo Ministério da Saúde.
De acordo com estimativas da Sesab, somente na área de
medicamentos, há 3,5 mil ações em curso contra o governo atualmente. “Isso
sobrecarrega o sistema”, avalia. Essa tendência não é exclusiva da Bahia.
Semana passada, o jornal O Globo publicou levantamento feito na Justiça Federal
entre 2013 e 2014, cujo resultado aponta a existência de 24,1 mil ações de
pacientes que buscam obter remédios através dos tribunais.
Segundo a Advocacia Geral da União, a maioria dos casos é
referente a remédios de custo elevado, que não são oferecidos no SUS. No
entanto, há casos em que o remédio figura na lista da rede pública. No
relatório da AGU, em 2013, foram 15.411 ações ajuizadas para obtenção de
medicamentos. Até 31 de julho deste ano, foram mais 8.768 ações.
A outra justificativa da Sesab é baseada no crescimento do
universo inserido no programa de alto custo. De acordo com números da Sesab
apresentados na última reunião do Comitê Intergestores Bipartite, que regula a
relação entre estado e municípios, a quantidade de pacientes saltou de 30 mil
para 87 mil nos últimos cinco anos. O gasto anual é de cerca de R$ 430
milhões com alto custo.
Para garantir tratamento
ao filho, dona de casa busca a Justiça
Lia Oliveira beija o filho Gilson, 30 anos, preso a uma
cama hospitalar há mais de dois anos e diagnosticado como tetraplégico. Gilson
não fala e se movimenta com muita dificuldade. Mas Lia tem esperança de
que o quadro mude. Ela diz que o destino não dá para modificar “para trás, só
para a frente”.
Lia com o filho Gilson,
tetraplégico: alimentação e remédios caros (Foto: Betto Jr)
Ela se
refere à noite de domingo em que dois rapazes, um deles amigo antigo da
família, agrediram seu filho a pauladas, a ponto de deixá-lo oito meses em
estado quase vegetativo no Hospital Geral do Estado (HGE), mais 12 meses
internado em uma unidade especializada em internamento domiciliar em Santo
Antônio de Jesus, no Recôncavo baiano. Moradora do distrito de Boa Nova, zona
rural da cidade, Lia conta que a briga ocorreu por causa de ciúmes de uma
mulher, com quem outro filho dela iniciou um romance.
“O rapaz não gostou e veio aqui agredir meu menino. Gilson foi
proteger. O mais moço escapou, Gilson não. Bateram nele tanto que (ele) ficou
assim. Logo o mais calmo de meus filhos, o que não procurava briga com
ninguém”, lembra. Hoje, a família se mudou para a casa que Gilson havia começado
a construir em Boa Nova, com dinheiro retirado nas plantações de laranja e
mandioca e na venda de farinha e de beijus.
Agora, ela busca tratamento adequado para o filho. Sobretudo,
para os caros remédios que ele usa e, mais importante, para garantir a
suplementação alimentar especial, que custa R$ 600 por mês. Trata-se de um
produto importado, o único que ele pode usar: o Support Nutrisson Soya Multi
Fiber, que custa, cada lata, R$ 58,90.
“Mas a prefeitura, o governo não ajudam. Decidimos não esperar e buscar
a Defensoria Pública para garantir o tratamento de meu filho. Ele não se movia,
e já está se movendo. Tenho esperança de que um melhor tratamento o ajude a se
desenvolver muito mais”, afirma.
FONTE:
http://www.correio24horas.com.br/detalhe/noticia/colapso-afeta-medicamentos-de-alto-custo-para-doencas-cronicas-e-ameaca-vida-de-pacientes/?cHash=479e55460cde48ff3ebbf4b0bd956020
Central Integrada de Comunicação Social
Classificação da Notícia: Saúde
11/06/2014 17:52:23
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Redatora: Anbar - MTbBA 690
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MP
media regularização no fornecimento
de medicamentos da assistência básica
de medicamentos da assistência básica
A
falta e/ou descontinuidade no fornecimento de medicamentos dos componentes
básicos e especializados da assistência farmacêutica na Atenção Básica, que tem
provocado inúmeros transtornos a pacientes e exigido, em muitos casos, a
judicialização para ser assegurado o direito dessas pessoas à saúde, foi tema
de um proveitoso ato público realizado no Ministério Público estadual na manhã
de hoje, dia 11. Convocado pelas promotoras de Justiça Kárita Cardim e Cláudia
Elpídio, que atuam na área da saúde e presidem um procedimento sobre o assunto,
o evento, onde inúmeros pronunciamentos ressaltaram que são problemas de gestão
dos poderes públicos que resultam na dificuldade de acesso dos medicamentos à
população, foi presidido pelo coordenador do Centro de Apoio Operacional de
Defesa da Saúde (Cesau), promotor de Justiça Rogério Queiroz.
Participaram inúmeros pacientes e seus familiares, bem como representantes de associações como a de transplantados,
das doenças de Parkinson e Alzheimer, hanseníase, AIDS, albinos e doenças
reumáticas, conselhos municipais e estaduais de saúde, Associação Brasileira e
Associação Baiana de Reumatologia, comissão de saúde da Ordem dos Advogados,
seção Bahia, Conselho Regional de Farmácia, Conselho Estadual dos Secretários
Municipais de Saúde, diretor e superintendente da assistência farmacêutica da
Secretaria de Saúde estadual (Dasf) entre outros, como a apoiadora do
Ministério da Saúde Joceléia Magni, que estava como observadora e foi convidada
a compor a mesa. Ela acumulou anotações dos apelos e queixas para levar em sua bagagem.
Muitos depoimentos de
parentes de pacientes sensibilizaram os presentes, como o de uma senhora que
lamentou não ter podido levar a filha que tem problema reumatológico, já
apresenta dificuldade em se locomover e está com as mãos atrofiadas, o que
acredita ser por causa da descontinuidade em dos medicamentos que foram
prescritos para amenizar seu sofrimento por falta nos postos médicos onde se
cadastrou. “Está faltando um bom gerenciamento na estrutura da saúde no caso
dos medicamentos e existe uma fila imensa para se submeter à terapia biológica”
segundo o médico Mittermayer, presidente da Associação Baiana de Reumatologia e
vice-presidente da entidade nacional.
Ele
explica que o Estado não tem estrutura para atender casos leves que exigem a
prescrição de medicamento que custa R$ 26,00, deixando que a doença se agrave e
o medicamento exigido vai custar R$ 5 mil, o que está, em seu entender,
exigindo mudanças. Ele considera caótica a falta de medicação em reumatologia e
cita que em sua área um paciente portador de artrite reumatóide não pode ter
uma parada subida da utilização de remédios, vez que isso significa um prejuízo
imenso à qualidade de vida e pode provocar situações irreversíveis como a
limitação de movimentos. No caso do lúpus, que afeta mulheres jovens entre 20 e
30 anos, pode matar.
Coube
ao superintendente e diretor da Dasf, respectivamente Robério Barros e Lucas
Andrade,
Entre
as sugestões apresentadas hoje, está a confecção de uma lista dos medicamentos
que são distribuídos para que seja encaminhada aos municípios a fim de que eles
não adquiram os remédios por preços acima do valor real, lembrando Rogério
Queiroz que deve-se pagar o preço CAP que prevê um abatimento de 24% para os municípios.
Mas, prossegue, há casos em que a venda ao usuário no balcão é inferior ao
preço CAP. Uma recomendação será expedida por ele para que os secretários
municipais de saúde estejam atentos para isso. Para o presidente do conselho
estadual dos secretários municipais de Saúde Raul Molina, “o grande problema é
que estamos na mão da indústria farmacêutica”. Por fatos dessa natureza é que a
presidente da Associação Baiana de Parkinson e Alzheimer, Beila de Carvalho
defende que as licitações possam ser acompanhadas por associações como a que
preside.
Fotos: H.F. Fotografia - Cecom/MPBA
FONTE: Ministério Público do Estado da Bahia www.mpba.mp.br